domingo, março 09, 2014

Borboletas

Odeio a forma como me fazes sentir. Odiar talvez seja um verbo muito forte; reformulo - tenho pena que me faças sentir da forma como me sinto quando me lembro que existes. Não porque não goste de ti; antes pelo contrário, tenho pena que me faças sentir da forma como me sinto quando me lembro que existes precisamente porque gosto de ti.
Não posso dizer que te amo porque nem sequer te conheço. Talvez esteja apaixonada porque quando alguma coisa me lembra que tu existes parece que me falta o chão debaixo dos pés, que o ar fica rarefeito e que, por momentos, o meu coração falha um batimento. Mas a paixão é algo mais forte do que a forma como eu me sinto quando me lembro que tu existes. E, estando apaixonada, não seria por ti, mas sim pela imagem que eu construí de ti, que nem sei se é verdadeira. Quando me lembro que existes sinto-me arrebatada. É isso, estou arrebatada por ti.
Quando alguma coisa me lembra que tu existes sinto-me arrebatada e com pena. Com pena de não ter sabido da tua existência noutro tempo, noutro contexto. Com pena de termos tanto em comum e nem nos conhecermos. Com pena que tenhas um papel tão importante na minha vida e nunca o venhas a saber.
Tenho pena que, quando te vejo, tudo à minha volta pareça ficar em câmara lenta, que os sons fiquem abafados e que os meus olhos não consigam fazer mais nada a não ser seguir-te. E depois tu desapareces e tudo volta ao normal excepto eu. Eu fico arrebatada, com pena de não te conhecer. Com pena de quase ser tua e tu nem saberes quem eu sou.
Tenho pena de não perceber como podes arrebatar-me desta forma, há tanto tempo, sempre com a mesma intensidade; pensei que, com o tempo, a força do arrebatamento fosse diminuindo mas enganei-me. Posso passar dias sem me lembrar que existes mas sempre que me lembro fico tão arrebatada como da primeira vez que me arrebataste. Nesse dia, os sons não ficaram abafados, a tua voz era a única coisa que se ouvia e, nas minhas entranhas, milhares de borboletas esvoaçavam e eu senti-me tonta, nervosa, com vontade de rir mas sem o poder fazer. Nessa noite quase não dormi, as borboletas não deixaram. Ultimamente, as borboletas estão mais calmas ou então já me habituei ao seu esvoaçar e não me parece tão forte. Agora o arrebatamento, esse continua igual.
Toda a pena que sinto reside na "platonicidade" deste arrebatamento. Porque sinto que se tudo isto não fosse platónico nos íamos dar muito bem. Se eu te conhecesse e tu me conhecesses, talvez até fossemos felizes para sempre, quem sabe.
Tenho esperança que um dia as borboletas se fartem das minhas entranhas e esvoacem para longe; que, quando me lembrar que tu existes, não me falte o ar ou um batimento cardíaco; que quando te vir tudo à volta não fique em câmara lenta e que os meus olhos consigam seguir outra coisa que não tu. Não quer dizer que deixei de gostar de ti. Quer dizer que deixei de ser arrebatada por ti.


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