sábado, abril 21, 2018

É preciso que nos perdoemos


Segundo a Wikipédia, “O perdão não é um ato. É um processo mental ou espiritual que tem por objetivo cessar o ressentimento tóxico (dentre eles, o principal é a raiva) contra outra pessoa ou contra si mesmo, decorrente de uma ofensa percebida, por diferenças, erros ou fracassos. Trata-se de uma habilidade que precisa de treino." 

Assim sendo, é preciso que treinemos a nossa capacidade de perdoar. É preciso que nos perdoemos com a mesma facilidade com que perdoamos aqueles que, de alguma forma, com ou sem intenção, com maior ou menor intensidade, nos magoaram. Só que perdoar a nós próprios é das coisas que mais treino requer, de entre de todas as modalidades do perdão. É doloroso, obriga-nos a olhar de frente para as nossas fraquezas, para as nossas feridas, para os nossos medos, para aquilo que fizemos menos bem; e no meio de todo este processo, faz-nos crescer imenso.
Por isso, é preciso que nos perdoemos. Não por termos amado alguém mas por não nos 
termos amado ao mesmo tempo. Não por termos acreditado que tudo ia correr bem mas por termos ignorado quando tudo começou a correr mal.
É preciso que nos perdoemos por termos permitido que nos tivessem magoado, por não nos termos defendido, por não termos gritado "Basta!", por termos calado a dor que nos estava a ser infligida - as pessoas não adivinham o que sentimos e o que pensamos.
É preciso que nos perdoemos por termos acreditado, pela culpa que sentimos pelo fracasso de algo que estava totalmente fora do nosso controlo.
É preciso que nos perdoemos por colocarmos nas mãos de outros o ónus de zelar pela nossa felicidade quando isso é uma responsabilidade inteiramente nossa. É preciso que nos perdoemos pelas (nossas) expectativas que colocámos no outro e que não lhe pertenciam. É preciso que nos perdoemos por não nos nutrirmos e não nos preocuparmos connosco tanto quanto nos preocupamos com o outro.
É preciso que nos perdoemos por não termos dado mais do que o que tínhamos, por termos desistido quando já não havia mais nada por que lutar.
É preciso que nos perdoemos por duvidarmos de nós, por sentirmos tudo por inteiro, por sermos apaixonados, por sermos resilientes.
É preciso que nos aceitemos tal como somos. É preciso que tenhamos orgulho de sentir e de amar intensamente, há quem não tenha esse privilégio. É preciso que sejamos capazes de sentir por nós mesmos esse amor intenso e apaixonado. Para que nunca duvidemos que fizemos o melhor que podíamos. Para que nunca duvidemos de nós.

domingo, abril 15, 2018

Palavras que nunca te direi

Se eu pudesse falar contigo, dir-te-ia que agora percebo que não vieste para ficar. Nunca ninguém vem para ficar, vem para ir ficando. Uns ficam uns dias, outros uns meses, outros o resto das suas vidas.
Dir-te-ia que agora sei que não estavas preparado para ter alguém que te amasse, que te desse colo, que te fizesse sentir inteiro. Não estavas preparado para voltar a confiar.
Dir-te-ia que agora entendo o que sentiste quando o teu coração se partiu em mil pedaços, quando te sentiste afogar em todas as lágrimas que choraste. Dir-te-ia que agora sei que te estavas a afundar lentamente e que, quando me arrastaste para o turbilhão de emoções e de desespero em que te encontravas, só estavas a tentar ficar à tona da água.
Dir-te-ia que todas as expectativas que eu criei foram alimentadas por ti. Dir-te-ia que despertar o amor no coração de alguém sem ter intenção de amar de volta não se faz, isso é um crime e isso eu não te consigo perdoar. Dir-te-ia que tentei não ser arrastada, que finquei os pés no chão, mas não consegui manter-me em terra firme. E agora sinto-me naufragar quando não tive culpa nenhuma da tua dor. Apanhei com os estilhaços todos e agora sou eu quem tem o coração partido em mil pedaços.
Dir-te-ia que percebi que me foste dando sinais, não posso dizer que fui apanhada de surpresa; mas quando não sabemos o que queremos, deixamos o outro confuso e o jogo do "hoje-quero-amanhã-não-quero" é cruel. E quando é assim, mais vale abrir o coração e dizer "não sei o que quero". Dir-te-ia também que não te perguntei mais cedo que tipo de relação tínhamos porque sentia que tinha que te dar tempo para sarares o teu coração, sentia que podia estar a afugentar um animal ferido e não te queria perder. Dir-te-ia que agora sei que fui tola em ter pensado tanto em ti e nada em mim; porque enquanto me preocupei com o que tu sentias negligenciei os meus próprios sentimentos e fui-me perdendo de mim.
Se eu pudesse falar contigo dir-te-ia que me arrependo todos os dias por não ter tido a coragem e o amor-próprio de te perguntar porque viste ver-me; dir-te-ia que deverias ter sido honesto contigo e comigo quando era óbvio que nada sentias e não foste capaz de o dizer. Dir-te-ia que me deixaste na incerteza, quando o que devias ter feito era ter desferido o golpe final naquele dia, presencialmente, e não semanas depois, à distância.
Dir-te-ia também que afastar alguém num dia e no dia seguinte voltar a puxá-lo para si e agir como nada se tivesse passado é cobardia. Dir-te-ia que a tua falta de coerência me despedaçou. Dir-te-ia que hoje me arrependo de ter insistido em trazer-te para a minha vida, que admito que aprendi muito mas eu estava tão bem na minha solitude e tu vieste abanar tudo.
Se eu pudesse falar contigo, dir-te-ia que compreendo perfeitamente que é difícil rejeitar alguém por quem se sente empatia mas não se sente amor; dir-te-ia que agora que tive que o fazer e que sei o que me custou, consigo sentir alguma compaixão pelo que possas ter sentido quando tomaste consciência que nada mais havia a fazer do que afastar-me completamente. Só não te perdoo teres ficado na tua zona de conforto a assistir à minha agonia sem teres sido capaz de agir para a dor ser menor. Bem sei que nós somos os únicos responsáveis pela nossa felicidade mas não devemos ser responsáveis pela infelicidade dos outros.
Se eu pudesse falar contigo, dir-te-ia que falta que eu me perdoe. Que me perdoe por não ter desistido, por ter tido esperança, por ter continuado a luta quando já não havia nada por que lutar. 
Se eu pudesse falar contigo, dir-te-ia tudo isto. Mas não posso, porque na verdade não quero.